29 de abril de 2008

À Máquina

(Foto por Leah Jones - Deviantart.com)


Pegou o copo meio vazio
Ou meio cheio
Como preferirem os otimistas de plantão
No seu rosto, a face de poucos amigos
Arremessou o resto do cigarro pela janela
Acendeu outro
Que venha o câncer, o efisema, o enfarte
O que mais vier será de bom tamanho
Lamentável é não vir nada, não imaginar nada...
O que foi feito do horizonte?
Em que momento o céu deixou de ser azul?
Esse apito? Já é o trem partindo?
E essas cortinas, quem as baixou antes da hora?
De um lado para outro
Quarto pequeno, janela aberta para a poluição matinal
Pegou o copo, completamente vazio
E então, otimistas, o que dizer agora?
Encheu os olhos, encheu o copo
Testa franzida encostada na parede branca
Folha em branco
Mente em branco
Vida em branco
Máquina esperando
A velha ansiedade da primeira linha
Aquela que nunca quer sair
Que não quer brotar
Mas hoje não teremos conto natimorto
Sentou diante do carrasco travestido de máquina, escreveu
“Pegou o copo meio vazio...”

25 de abril de 2008

Zero Absoluto

Foto por Chamstudio - Deviantart.com


Lá fora
Céu azul
Nuvens brancas como a barba de Deus
Ele tem barba?
Espero que sim, é uma imagem reconfortante
Tomara que também tenha paciência infinita
Vou precisar, um dia...

Lá fora
Dia de sol requentando sonhos
Grama verde, toalha posta no chão
Flores multicores, cesta cheia de guloseimas
Muito zum-zum, muito alarido, gritos infantis
Alguém empinou uma pipa engraçada

Isso é lá fora...

Aqui dentro?
Céu carregado
Silêncio
Neve

Melhor assim...

Zero absoluto
Zero risco

21 de abril de 2008

Silêncio e Estrelas

(Foto por AccessQ, Deviantart.com)


"Em que estrela, amor, o teu riso estará cantando?" [Quintana, in Eu Fiz um Poema]

Não há estrela que me faça cantar como outrora cantei

“E nada vibrou...
Não se ouviu nada...
Nada...
Mas o cristal nunca mais deu o mesmo som.
Cala, amigo...
Cuidado, amiga...
Uma palavra só
Pode tudo perder para sempre...
E é tão puro o silêncio agora!”
[Quintana, in Canção de Vidro]

Façamos então, do silêncio, morada
E nele naveguemos e miremos estrelas
Compremos binóculos...
Para que a estrela mais distante não deixe de ser admirada...
Desejada...
Alcançada!
Fiquemos em silêncio então...
E deitados no chão, na relva e de mãos dadas
Usemos os binóculos e miremos nossos anseios
Guiados por estrelas, seguindo nosso norte
O meu e o seu, talvez o nosso
Talvez...
Empreguemos então, a leveza...
Esqueçamos o habitual, mas sem deixar de colher a cumplicidade...
Sejamos nós mesmos, sem condicionantes!

"As únicas coisas eternas são as nuvens..." [Quitana, in Epígrafe]

Corramos na chuva
Sejamos como crianças
Sonhemos como adultos








Ps.: Outro poema feito a quatro mãos com a Ana Fernandes via MSN (God bless technology), desta feita com inspiração do mestre Quintana (Ok, assim fica fácil fazer poesia, não?). Todos os versos dele foram tirados do blog Eterno Espanto.

Prefiro o Bonde da Lapa


Caminhava pelo centro de minha adorável cidade, João Pessoa, refletindo sobre coisas tão diversas quanto os problemas da segurança pública e o calor infernal dos últimos dias, quando, de repente, sou retirado dos meus devaneios por um cartaz singular que anunciava um espetáculo musical a ser apresentado em breve. Dizia assim: “Bonde do Maluco: O Fenômeno do Arrocha”. Definitivamente nasci na época errada e provavelmente no país errado também. Alguns felizardos podem dizer que viram surgir os primeiros acordes do Blues. Outros tantos podem dizer que acompanharam a gestação e nascimento do Rock’n’Roll. Alguns me dirão que ouviram o Punk Rock chocar ouvidos nos subúrbios britânicos. Muitos ainda se deleitarão em me contar que estavam nas praias do Rio de Janeiro quando a Bossa Nova veio ao mundo em acordes melodiosos de violão. E quanto a mim? Bem... eu posso orgulhosamente dizer que tive o incomensurável prazer de acompanhar o surgimento e queda de vários “fenômenos musicais”. Por exemplo, vi o Axé surgir em rimas suspeitas que falavam dos penteados da nega do cabelo duro e em seguida passaram a falar de mulheres que rebolavam sem parar e tinham predileção por gargalos de garrafa. Em seguida pude me regozijar com a ascensão do pagode romântico pré-fabricado. Eram aquelas bandas, quer dizer, grupos (por que banda é outra coisa) formados com seis ou oito caras legais, cada um fingindo tocar um instrumento, sempre fazendo uma coreografia enquanto falavam de cachaça, chifre ou problema. Pude ver o tradicional som do interior de Goiás ser reduzido ao fenômeno das duplas sertanejas. Era fácil, bastava juntar um cara que cantava pouco com outro que não canta nada (vide Zezé e Luciano para maiores esclarecimentos) e escrever canções que irremediavelmente falavam de, vejam só que criativo, chifre, cachaça e problema. Pude também me deliciar com as bandas de forró elétrico criadas no Ceará. Como bom nordestino que sou, vou dizer apenas que, se tivesse oportunidade, Luiz Gonzaga retornaria do além para passar a faca peixeira em todas essas bandas moderninhas (com nomes esquisitos, vide “Forró dos Plays” e sim, pode gargalhar agora) e transformá-las em picado para cozinhar uma boa buchada! Mas a coisa não pára por aí. Tenho que lembrar do Funk, pois foi ele que me trouxe a estas linhas. O Bonde do Maluco vai passar em minha cidade. Isso me preocupa. Tirem as crianças da sala, tapem os ouvidos, fechem os olhos ou corram o risco de serem “arrochados”. Nós não merecemos mais um fenômeno desses. Certamente alguns me rotularão de velho, chato e resmungão. Posso ser chato e resmungão, inclusive nunca neguei, mas, desculpem-me os moderninhos de plantão, eu não aceito nem que me digam que isso de bonde, seja do Maluco ou do Tigrão, é música, pois não é mesmo. E o que mais posso fazer além de lamentar? Enfim, que fique ao menos registrado este meu lamento. E, apesar de nunca ter estado no Rio de Janeiro, em se tratando de bonde carioca eu prefiro o Bonde da Lapa. Nele há muito mais poesia, elegância, história, beleza e música do que em qualquer outro bonde, seja ele maluco ou são.

20 de abril de 2008

Pular?

(Foto por Little Miss Jackass - Deviantart.com)



Não demoro, volto logo
Ainda é cedo, não há motivo para aflições
Quando for tarde saberemos
Ou, ao menos, deveremos sentir
Veremos folhas mortas caírem em carrossel
Sol se pôr, sem festa e sem beijo de despedida
Mas quero aproveitar o fim da tarde
Quero o sabor da minha infância
Quero o prazer do primeiro olhar, da descoberta
Não serve redescobrir, não é novidade
Serve a panela onde foi feita a cobertura de chocolate
Serve o pé de caju em dia de sol
Serve mar colorido e contar conchinhas na maré vazante
Serve se for eu, se for você, se formos nós
Melhor não pensar muito
Mas é bom ter certeza da altura do tombo
Prudência é saber quão profunda é a água
Depois é só fechar os olhos
Tapar o nariz
E pular?

15 de abril de 2008

Na Cozinha

(Foto por Bongshock - Deviantart.com)

Lágrima e sal e cozinha repleta de receitas
Trazem lenha, sentam-se, tricotam malhas surradas
Café é bom no copo, queima a mão
Brincar com fogo dá azar, melhor bater três vezes na madeira
Provam, mas não conseguem decidir, passou do ponto?
Surpresa, as notícias são antigas e não saem de moda
No forno, mistura para bolo de limão
No pão dormido, mosca que pousa e voa e pousa e voa
Na toalha quadriculada, joga-se xadrez
Rei que, secretamente, deseja se entregar aos braços e abraços da dama
Na face, semblante de esperança requentada, um tanto quanto cansada
Beija-se boca, esconde-se a alma
Ela quer a métrica que completa sua poesia
Não vê a hora de vestir-se de brincos e brincar de Lady Godiva
Fornada pronta de biscoitos chineses da fortuna
Hoje você encontrará o seu grande amor
Amanhã você fará uma viagem para um país distante
Sua cor da sorte é azul e não use alianças
Não terás sorte com elas, seja em que mão for
Tarde passa, noite chega, pouco é dito
Perguntas deixam de ser feitas, respostas não são desejadas
Penumbra na cozinha, fogo que se apaga
Mas há brasa
E basta apenas uma...

13 de abril de 2008

Para Dias Frios

(Foto por Shoops - Deviantart.com)


Só falta o edredom...
O vinho...
E o alguém.
A chuva já veio
E parece-me que a chuva esse ano vai ser mais longa e o frio mais intenso...



Ps.: Poeminha feito a quatro mãos via MSN. Duas minhas, duas da Ana. Gracias Buena Niña, o Pulga fica feliz por sua colaboração...

11 de abril de 2008

Coragem, Coração e Cérebro

(foto por jonukwho - deviantart.com)


Construo caminhos com meus próprios tijolos de ouro. De tolo, claro... Mas é fabricação própria, não devo a ninguém. Quanto ao mágico, se aposentou há tempos. O encanto se foi junto com ele, e por isso a lua não é mais feita de queijo e estrelas cadentes não realizam mais desejos. Já a bruxa má resolveu expandir os horizontes, terceirizou alguns serviços e abriu franquias, conseguindo chegar aos quatro pontos cardeais. É isso, a bruxa está solta e eu aqui preso em tergiversações sem sentido. Mas a busca continua a mesma. Procura-se coragem, coração e cérebro. Assim, os três ao mesmo tempo. Não serve em doses homeopáticas dadas de seis em seis horas. Tem que ser aplicado direto na veia e em dose única. E antes que você sugira, também não aceito em forma de supositório. Ando tendo alucinações. Ou não? Ainda ontem o Ming, aquele mesmo, O Impiedoso, bateu à minha porta e foi logo dizendo que vinha buscar a minha alma. Negociei com ele e ofereci em troca um par de chicletes Buballoo, uma fita do Senhor do Bonfim e um clipe enferrujado. Ele não quis, os chicletes não eram de uva. Apelei para o seu bom senso. Sua tarefa não era coletar almas, e sim tirar a paciência do Flash Gordon, ou seria o contrário? Por fim, viu que não valeria a pena, havia almas mais interessantes para tomar. Respirei aliviado, apesar da desfeita, e me comprometi em comprar uns chicletes de uva para necessidades futuras. Ponho casaco em dia de calor. Ando nu quando faz frio. Tomo remédio sem receita. Faço poesia quando quero fazer prosa. Cumpro promessa que não fiz e faço chá das minhas demências. Eu sei. É muita confusão e papo sem sentido. Mas é que, desde então, há um vazio muito grande. E como não sei mais o que fazer para ocupar esse vazio, preencho-o com qualquer idéia que me ocorra. Onde está a Dorothy? Onde está a minha coragem, meu coração e meu cérebro?

10 de abril de 2008

Grãos de Areia

foto por Strange - deviantart.com


Teimo em catar grãos de areia
Apenas para vê-los escorrendo entre meus dedos
E pouco me importa, torno a catá-los novamente
Teimo em catar grãos de areia...
Já vi esse filme, tem gosto de ranço
Tem sabor de teimosia ingrata e de mau gosto
Há outro tipo de teimosia?
Gravito ao redor igual satélite cortejando o sol
Mil desculpas antes de dormir
E promessas tão fugazes quanto um orgasmo
Ouço vozes admoestando quanto ao juízo final
Abro uma cerveja
Gostaria de acender um cigarro
Dou de ombros, finjo seguir adiante
E já me disseram
Você se revela em suas poesias
Mas, ora bolas, de que me servem elas então?
Sondo minha alma, exponho no mercado
Grita o feirante e me asperge água
Gesticula oferecendo grãos de areia que me fogem dos dedos
E na minha boca morre o verbo que não quero conjugar
E não é apenas por teimosia
É medo e coisas que não sei contar

8 de abril de 2008

Contando os Dias

foto por dvy - deviantart.com


E lá estava eu
Realizando a conta dos meus dias
Somando uns quinhões aqui
Subtraindo outros acolá
Poucas vezes multiplicando
Mas, felizmente, em muitas dividindo
Fiz do ábaco um companheiro
Ponta de lápis e borracha à mão
Fiz planilha
E dela relatório
Porcentagens à parte
Descobri saldo positivo
Algumas contas por pagar
Outras tantas por receber
Não gostei do passivo
Preferi o ativo
Investimentos?
Foram muitos
Nem todos renderam dividendos
Mas alguns resultaram no patrimônio
E deste não me desfaço
Partilho em verso e prosa o que consegui amealhar
Desvelo em linhas o resultado do balanço
Na conta dos meus dias
Depois da prova dos nove
Restou a poesia
Moeda forte que inflação não desvaloriza

Cheiro de Dia Ruim

(foto por Quemas - deviantart.com)


Cheiro de dia ruim
Bolor que se esconde e fareja
Chuva caindo intermitente
Frio, solidão, conversa sem sentido
Ansiedade batendo nos calcanhares
Desgosto, pesar e pouco para comer
Fuga, andar em círculos, perder pistas
Lembranças tão vagas quanto a maré
Areia sob os pés, vento afugentando idéias
Relógio soando a hora de Brasília
E eu sei, temos manias estranhas
E conforto na poesia

Cheiro de dia ruim
Há dias assim
Impregnados
Evocativos
Torturantes
Delirantes
Repetitivos
Desconcertantes
E mais do que tudo
Vazios

6 de abril de 2008

Tempo




"O Tempo corre e a Vida escorre."


Eveline Alvarez

Coisas do Pessoa

"Eu tenho uma espécie de dever , de dever de sonhar,
de sonhar sempre,
pois sendo mais do que
um espectador de mim mesmo,
Eu tenho que ter o melhor espetáculo que posso.
E assim me construo a ouro e sedas,
em salas supostas , invento palco , cenário para viver o meu sonho
entre luzes brandas e músicas invisíveis."

Fernando Pessoa

Quantos palcos vivemos inventando? Quanta poesia deixamos de viver?

E. Alvarez

Noite Com Chuva

(foto por Red Fraction - deviantart.com)


Hoje, a noite não quer calar
A chuva lá fora
Compõe uma sinfonia triste
Letra e música da tua ausência.
Em noites como essa,
Tua ausência é ainda mais presente
Insistindo em se propagar
E permanecer.
Como que por impulso
Desejo que sintas o mesmo
Estás dormindo? Estás sentindo?
Perguntas sem respostas...
Noite com chuva
Silêncio de sentimentos
Vontade de você
O amanhã como recompensa.

Por ANA FERNANDES

Hoje é aniversário de Ana Fernandes, amiga e recém descoberta poetisa. Sofre do mesmo mal de outros tantos, esconde seus poemas e tem reticências em publicá-los. Mandou-me este, o resto da história está aqui. Poemas não devem ser escondidos. E, apesar da estação haver mudado, a sintonia não se perdeu. Feliz aniversário, um beijo e um sorriso!

Não Precisava Ser Assim

Ela vem
Mas não há aviso
Por vezes é benção, noutras maldição
Alívio para alguns
Preço a ser cobrado para outros
A morte...
É assim
Hoje vive-se
Amanhã, quem sabe?
E, de tanta vida que tinha, não soube o que fazer
Perdeu-se entre os encantos de sua própria falta de virtude
Buscou e não achou
Foi amado, reconheceu, mas recusou
Táxi para a estação lunar todos os dias
Alma boa, pensamento torto
Criança querendo colo
Luta, em alguns dias
Em outros, entrega
Por fim
Desistiu...
E entre tantos jazigos
Grandes e pequenos e suntuosos e simples
Ocorreu-me o seguinte
Ela é assim, vem para todos
Mas não precisa ser buscada
Não precisa ser dolorosa
Não precisa ser em vão
Não precisa ser tão cedo, apenas trinta...
E agora é só o vazio das palavras não ditas
Esperança de haver algo além
Desejo de rever o sorriso solto
E esperança não é a última que morre
A morte não a alcança



(Foto por Eddie Ferla - deviantart.com)



Essa é uma pequena homenagem a um primo meu, Adriano. Viveu tão intensamente que se consumiu em chamas antes mesmo de saber o que a vida realmente era. Mas, afinal, quem sabe? E, apesar do pouco contato nos últimos anos, fará falta. É injusto morrer tão cedo e de forma tão tola.